Era uma casa nova, uma rua nova e, principalmente, eram vizinhos novos. Uma construção baixa, no alto de uma rua feia com alguns terrenos vazios, árvores, gramados, crianças brincando fora das casas. Mudei-me para um bairro retirado da cidade. Eu, que estava acostumada a viver no bairro central, fiquei admirada com a alegria das crianças que pela faixa de paralelepípedo corriam. Com meus calmos cinco anos, sentei-me ao meio-fio e desejei ter uma tangerina para comer.
Aproximou-se de mim um rapaz magro de cabelos pretos com aproximadamente dez anos, perguntou-me como eu me chamava e me convidou para brincar. Falei-lhe o meu nome e respondi que permaneceria ali, sentada. Devo ter pronunciado mais umas duas palavras, porém me recordo somente de ter abaixado a cabeça, ter brincado com as pedrinhas do chão e ao erguer novamente o olhar, na minha frente com o rapaz estarem duas meninas, uma um pouco mais velha que ele e a outra talvez da minha idade. Sorriam alegremente e me observavam como se fosse um brinquedo na vitrine de alguma loja. O rapaz, que se apresentou como Pedro, deu uma gargalhada e me disse que as duas moças eram suas irmãs, Bruna e Ana.
As duas crianças mais velhas sentaram-se ao meu lado e questionaram se eu era a nova moradora da casa da esquina. Sinalizei que sim com a cabeça e, olhando para o chão, dei um sorriso com o canto da boca para os meus vizinhos da frente. Algumas outras crianças saíram das casas e logo percebi que era a hora de todas brincarem. Levantei-me para brincar com elas, não sem antes resistir um pouco. Começavam aí três anos de amizade entre mim e meus vizinhos, três anos que hoje me parecem muito mais.
Jogar bola, andar de bicicleta, brincar com os cachorros, com carrinhos, com bonecas, várias eram as atividades que preenchiam as minhas tardes, mas confesso que a mais prazerosa de todas para mim era subir no pé de goiaba que havia no final da rua sem saída. Do alto da árvore eu conseguia olhar toda a rua, o topo de todas as casas. No balanço pendurado naquela árvore eu sentia a liberdade bater em meu rosto, o vento tinha um sabor especial, assim como a goiaba que eu colhia e nem lavava, apenas limpava na camiseta já não muito limpa.
As tardes de sol após as manhãs de chuva eram por mim adoradas. A terra – para fúria da minha mãe – ficava molhada, o mato ganhava um cheiro mais atraente e lá ia eu, embrenhar-me pelo terreno baldio, subir na goiabeira e depois pular na terra enlameada. Voltava para casa coberta de barro, descia o barranco dos fundos do terreno da minha casa sobre um pedaço de papelão até não ter mais força para subir correndo. Após gastar todas as energias, abria a mangueira e fazia a festa: era água espirrando por todo o jardim, fazia de conta que era um chafariz ou uma chuva de verão.
Nos finais de semana eu jogava bola com meu pai no campinho de futebol que montávamos no enorme gramado atrás da casa. Foi meu pai que me ensinou a jogar futebol e me passou o gosto pelo esporte; foi com ele que aprendi a gostar de assistir aos jogos na televisão e a franzir o nariz quando um jogador do meu time perde a bola ou erra um gol. A minha mãe me ensinou a deixar tudo sempre arrumado, costume que de criança eu reprovava, mas hoje percebo que sou igual. Eu gosto de ser igual.
Entre muitas histórias boas e algumas não tão agradáveis, resta-me uma certeza: os três anos naquele bairro – e os demais da minha infância – foram bons e são freqüentemente lembrados principalmente quando o inverno chega e, ao comer uma tangerina, sinto o cheiro da infância e desejo ter um meio-fio para me sentar.
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