Drummond que era sábio. Este sim sabia falar sobre o amor e as coisas do coração:
"Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita."
Trecho de Amar, de Carlos Drummond de Andrade.
Sem tempo para escrever, só lendo muito.
(Eu, tu, ele, ela... Nós, só nós.)
quarta-feira, 30 de setembro de 2009
quarta-feira, 9 de setembro de 2009
Velha nova vida
Uísque, livros, cigarro. Sono, muito sono, vinte e três horas, cama. Acordo assustado, sete e meia. Levanto vagarosamente, com toda preguiça que se pode ter depois de passar a noite lendo. O sol já forte penetra o meu quarto através das frestas da janela, lembrando-me de que bebi demais na noite anterior. A janela velha já não fecha direito, preciso trocá-la, mas só de pensar no trabalho que me causará já me sinto cansado.
Preciso trabalhar. Olho no relógio e já estou atrasado. São oito e quarenta, estou ainda de pijama e de barba comprida. Nove horas. Vou ligar para o escritório e avisar que estou doente. Se perguntarem o que tenho direi que estou com febre e manchas vermelhas pelo corpo. Se pedirem que eu vá ao médico e traga um atestado, ligarei para aquele velho amigo de meu pai e pedirei um por correio. "Para três dias, por favor. O que tenho? Ah, não sei, qualquer doença meia-boca. Eles vão acreditar, é serviço público!" Pensando bem eles nem vão pedir atestado.
Ligo para meu chefe e a secretária me informa que ele ainda não chegou, talvez nem chegará. A simpática moça diz que passará o recado e anota meu nome e telefone. Acendo um cigarro, encho um copo de uísque e coloco um vinil para tocar. Adormeço e acordo duas horas depois com o som desligado e o copo de uísque derramado. Vou até a prateleira, foleio meia dúzia de livros até escolher um para ler. Leio três ou quatro páginas e o cheiro de livro velho e guardado faz-me recordar os meus planos de adolescente. Já tinha até escolhido o roteiro do meu mochilão pela América. Ah! Que saudade da minha juventude.
Trinta e três anos, a idade que dizem ser a de Cristo, uma idade para grandes atos. Grande ato! É disso que preciso, uma mudança, uma razão para continuar a sobreviver. Tiro do armário uma mochila daquelas de fazer trilha, tiro o pó acumulado há anos e coloco duas calças, algumas camisetas, cuecas e meias, calço meus tênis de corrida e saio de casa rumo à rodoviária. Não avisei ninguém, nem meus velhos pais. Vão me chamar de louco, vão dizer que não penso nas consequências ou vão pensar que morri? Mandarei um postal e tudo ficará bem...
Viver é preciso!
Preciso trabalhar. Olho no relógio e já estou atrasado. São oito e quarenta, estou ainda de pijama e de barba comprida. Nove horas. Vou ligar para o escritório e avisar que estou doente. Se perguntarem o que tenho direi que estou com febre e manchas vermelhas pelo corpo. Se pedirem que eu vá ao médico e traga um atestado, ligarei para aquele velho amigo de meu pai e pedirei um por correio. "Para três dias, por favor. O que tenho? Ah, não sei, qualquer doença meia-boca. Eles vão acreditar, é serviço público!" Pensando bem eles nem vão pedir atestado.
Ligo para meu chefe e a secretária me informa que ele ainda não chegou, talvez nem chegará. A simpática moça diz que passará o recado e anota meu nome e telefone. Acendo um cigarro, encho um copo de uísque e coloco um vinil para tocar. Adormeço e acordo duas horas depois com o som desligado e o copo de uísque derramado. Vou até a prateleira, foleio meia dúzia de livros até escolher um para ler. Leio três ou quatro páginas e o cheiro de livro velho e guardado faz-me recordar os meus planos de adolescente. Já tinha até escolhido o roteiro do meu mochilão pela América. Ah! Que saudade da minha juventude.
Trinta e três anos, a idade que dizem ser a de Cristo, uma idade para grandes atos. Grande ato! É disso que preciso, uma mudança, uma razão para continuar a sobreviver. Tiro do armário uma mochila daquelas de fazer trilha, tiro o pó acumulado há anos e coloco duas calças, algumas camisetas, cuecas e meias, calço meus tênis de corrida e saio de casa rumo à rodoviária. Não avisei ninguém, nem meus velhos pais. Vão me chamar de louco, vão dizer que não penso nas consequências ou vão pensar que morri? Mandarei um postal e tudo ficará bem...
Viver é preciso!
Talita Wuerges
Ausência
Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.
Carlos Drummond de Andrade
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.
Carlos Drummond de Andrade
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